17 de abr. de 2024

Não consigo estar entre os demais, não consigo sair do casulo, pois sou um eterno projeto inacabado, fui feito de forma mal feita, me sinto limitado por tudo aquilo que apenas me é permitido ser, o que não é muito. Por isso prefiro me manter sozinho e longe dos olhares, longe da realidade que tenta o tempo todo quebrar a figura mental que tenho de mim mesmo, sou muito mais enriquecido aqui dentro, tenho muito mais cores e só necessito da minha própria permissão para ser e explorar tudo aquilo que me arregala os olhos e cintilam minha retina. Penso que se eu tivesse nascido ao inverso talvez fosse mais fácil, talvez me fosse mais permitido experimentar além do catálogo local, digo isso, pois corpos invertidos são tão mais vivos, únicos e autênticos na arte de cuidar e adornar seus corpos, enquanto minha categoria é acinzentada, é industrializada para replicação em massa. Sei que muitas pessoas também não refletem ao espelho, mesmo aqueles em inversão, mas, para mim, refletir algo não é apenas uma escolha, é talvez o motivo de eu estar aqui, algo precisa ser criado, o novo precisa ser inventado, e quando falo precisa falo com ênfase na necessidade e na urgência solicitada pelo resultado da divisão que opera em quem almeja ser um indivíduo. Uma única vez, me foi sugerida a escolha de ser, por alguém não tão próximo, mas com olhos de camaleoa, fazendo seu papel num mundo onde há tantos à toa. Não me esqueço e nunca me esquecerei, o que é ser ouvido mesmo sem ter falado e cuidado mesmo sem ter se acidentado. Será que um dia irei conseguir organizar o caos em que fui posto, sentir novos sabores e descobrir meu próprio rosto, ou viverei para se alimentar apenas daquilo que não tem gosto?

11 de fev. de 2024

Porque era eu que o elevava pela cintura, sendo seu único suporte, frente ao nada que, mesmo com pouca relevância, ainda nos cercava. Por um momento, nós dominávamos o mundo juntos na mesma decadência. O que antes se ingeria agora corroía tudo aquilo que pensávamos ser, já não estava mais condicionado pelos movimentos dos ponteiros, mas sim pela força com que nossas peles se chocavam, ambos bagunçados, desafiando perspectivas com risos que se repetiam numa sequência que desafiava todos os enunciados possíveis. Eu desejava, com bastante clareza, que tudo fosse respaldado pela mesma realidade que bombeia meu coração e lhe dá o direito de querer encapsular aquilo que te provoca. Intensificado e acelerado, fervorosamente apaixonado, eu o odiava por não olhar nos meus olhos, eu era o único querendo vencer num jogo onde brincar era o objetivo, eu era o único, mais uma vez, vivendo algo intrinsecamente disruptivo. Tentando canibalizar meus desejos com uma dentição insuficientemente bruta, me debatendo contra paredes e jurando a mim mesmo que não haveria mais nada a ser questionado, desde que minhas mãos estejam postas na presa.
Como é ruim olhar em direção a quem olha em outra direção e não ter a ignição suficiente para conduzir os olhares de quem lhe agita os instintos, queria ser invasor e ser invadido, ir longe, chegar perto e cravar as garras em pele para que ninguém mais o faça, faço contorcionismo em palavras apenas para nada me escapar, sou feroz, brutal e divergente a tudo aquilo ao qual tentam me qualificar, eu mais do que ninguém sei o que quero e quem eu quero e sim, tenho folego para matar, tudo e qualquer porcaria que surja tentando tomar seu lugar, minhas pupilas são pontiagudas justamente porque só preciso ver o alvo no qual estou tentando atirar.